sexta-feira, 26 julho, 2024

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Ativistas analisam quadro de violência na Bahia

Em meio às discussões sobre o assassinato da vereadora negra Marielle Franco no Rio de Janeiro, dados da Secretaria da Promoção da Igualdade da Bahia (Sepromi) mostram uma tendência de aumento no registro de racismo no estado.

Enquanto isso, estatísticas de janeiro de 2018 da Secretaria de Segurança Pública (SSP) apontam que os registros de violência grave contra as mulheres – que somam feminicídio, homicídio doloso, tentativa de homicídio, lesão corporal dolosa e estupro – caíram 26,57% em relação ao mesmo mês do ano passado.

No caso dos crimes raciais, 30 registros foram feitos até a última sexta-feira, quando esta reportagem foi fechada.

O número, que diz respeito a menos de um trimestre, já que o mês de março nem terminou, representa quase metade do que foi contabilizado em todo o ano de 2017, quando o Centro de Referência de Combate ao Racismo Nelson Mandela, equipamento da Sepromi, recebeu 66 denúncias.

Já as violências graves contra mulheres somaram 1.285 casos em janeiro deste ano, conforme a mais recente atualização feita pela Secretaria de Segurança Pública da Bahia (SSP-BA). Em 2017, esse número, no mesmo janeiro, chegou a 1.750 – o que configura a taxa de 26,57% de redução.

Violência estrutural

Para a titular da Sepromi, a socióloga Fabya Reis, discursos de incitação ao ódio contra as minorias podem explicar a tendência de aumento dos registros de racismo. Um conjunto de variáveis, no entanto, têm influência sobre esse fenômeno, opina ela.

“Historicamente, as mulheres negras e pobres são o público mais vulnerável, culminando no último estágio de violência, que é tirar a vida das pessoas, como aconteceu nesse caso da vereadora carioca Marielle. Mas agora há um ativismo maior dessas mulheres e uma rede de proteção mais atuante”, analisa Fabya.

Esse novo cenário, afirma a secretária estadual, “empodera e encoraja” mais denúncias sobre crimes raciais. Nos casos de violência feminina, frisa ela, há dois tipos de casos: o doméstico, praticado dentro de casa, e o estrutural, praticado pelo próprio Estado. “É preciso diferenciar, porque o caso de Marielle é uma violência estrutural”, explica.

Militante do Psol, mesmo partido que elegeu Marielle no Rio, e ativista do coletivo Tamo Juntas!, a advogada feminista Laina Crisóstomo defende que há uma sub-notificação dos casos, causada, define ela, por “falta de sensibilidade do sistema de segurança”.

Essa invisibilização, conta a ativista, se dá tanto nas delegacias quanto em órgãos superiores, como o Ministério Público. Em um caso acompanhado por ela, que trata sobre o esfaqueamento de uma mulher pelo marido, o órgão o classificou como homicídio simples e não como feminicídio, explica a advogada.

“Há uma tentativa de forjar esse dados como se quer, para que não se invista em políticas públicas para essas mulheres negras que sofrem diariamente uma dupla violência”, afirma.

Ódio

A advogada acredita, ainda, que figuras que possuem discurso conservador, como o pré-candidato à Presidência da República Jair Bolsonaro (PSL), dão coragem a agressores antes ocultos.

“O discurso de ódio tem ganhado poder. Tem mais gente sendo agredida, até nas rede sociais, e a morte de Marielle foi um recado. Não mataram uma militante de esquerda, mas mataram ela por ser mulher e negra. Marcelo Freixo, que é homem e branco, denunciava as mesmas milícias e não foi morto. Marielle foi morta. Foi um recado deles”, opinou a militante feminista.

Ouvidora da Defensoria Pública do Estado da Bahia (DPE-BA), a socióloga Vilma Reis mostrou-se surpresa com os dados apontados pela reportagem. Ela atribui a redução nos números de violência contra as mulheres, entretanto, aos debates públicos sobre o tema.

“Essa pode ser uma resposta ao trabalho no longo prazo. Essas questões têm sido mais discutidas na sociedade por meninas cada vez mais jovens, o que é positivo”, acredita Vilma, elogiando iniciativas recentes.

Entre as citadas, estão um convênio assinado entre a SSP e Secretaria de Política para Mulheres (SPM), a fim de treinar policiais para registrar corretamente o crime de feminicídio; e a criação da Delegacia dos Direitos Humanos, anunciada pelo titular da SSP, Maurício Teles Barbosa.

Apesar disso, para a socióloga, o aumento do discurso de ódio no País trata-se de um fenômeno que ainda precisamos compreender melhor. “A gente vive algo novo no Brasil, que é a direita fascista se manifestando publicamente, sem pudor nenhum”, criticou.

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