Bebês prematuros podem enfrentar desafios que vão além do baixo peso e da imaturidade pulmonar. As cardiopatias congênitas, malformações no coração que surgem ainda na gestação, estão entre as principais preocupações e ganham destaque no Novembro Roxo, mês dedicado à sensibilização sobre prematuridade e cuidados essenciais aos recém-nascidos.
Segundo o Ministério da Saúde, entre seis e oito bebês a cada mil nascidos vivos apresentam algum tipo de cardiopatia. Considerando todos os nascimentos, a estimativa é de que um em cada 100 bebês tenha algum defeito cardíaco. Esses indicadores reforçam a importância do diagnóstico precoce e do cuidado especializado para garantir um início de vida mais seguro.
A cardiologista pediátrica Keylla Passos, coordenadora do Serviço de Cardiologia Pediátrica do Hospital Mater Dei Salvador, explica que algumas alterações são mais frequentes em prematuros. “As doenças cardíacas congênitas mais comuns nesses bebês são o canal arterial patente, a comunicação interventricular e a comunicação interatrial”, afirma.
O canal arterial patente (PCA) é uma estrutura presente em todos os fetos e que deveria se fechar nas primeiras horas após o nascimento. Em prematuros, esse processo pode demorar ou nem ocorrer espontaneamente, causando sobrecarga no coração e nos pulmões. Já as comunicações interventricular (CIV) e interatrial (CIA) são aberturas entre câmaras cardíacas que podem se fechar naturalmente quando pequenas.
A CIA e a CIV provocam mistura inadequada de sangue entre as cavidades, levando a cansaço, dificuldade de ganho de peso e maior risco de infecções respiratórias. A Sociedade Brasileira de Pediatria aponta essas malformações entre as causas mais comuns de internação cardíaca em prematuros e alerta que, sem tratamento, podem evoluir para insuficiência cardíaca ou prejudicar o desenvolvimento.
O diagnóstico de algumas comunicações pode ser feito ainda na gestação, mas há limitações. “Quando o defeito é muito pequeno, abaixo de três milímetros, o ecocardiograma fetal pode não identificar, dependendo muito da posição do bebê e das limitações naturais do exame. Nesses casos, o diagnóstico costuma ser feito após o nascimento e, felizmente, não traz risco imediato à vida do recém-nascido”, explica Keylla.
O PCA e a comunicação interatrial, por sua vez, só são identificados após o parto. “Essas estruturas existem e permanecem abertas durante toda a vida intrauterina. O esperado é que se fechem naturalmente, mas nos prematuros isso nem sempre acontece”, completa.
Nem todas as cardiopatias exigem intervenção imediata. Muitas se fecham sozinhas, mas, quando isso não ocorre, o tratamento depende da gravidade. O PCA pode ser corrigido com medicação, cateterismo ou cirurgia. “A decisão é sempre individualizada, baseada na evolução clínica de cada bebê”, afirma a cirurgiã cardiovascular pediátrica Nadja Kraychet, também do Hospital Mater Dei Salvador. A mesma lógica vale para CIA e CIV: quando pequenas, apenas acompanhamento; quando maiores, fechamento por cateterismo ou cirurgia.
Os riscos vão além da infância. Estudos da Organização Mundial da Saúde mostram que adultos que nasceram prematuros têm maior probabilidade de desenvolver doenças cardiovasculares, como hipertensão, diabetes tipo 2 e síndrome metabólica.
“Os maiores riscos para a saúde cardiovascular desses bebês, ao longo da vida, são a hipertensão arterial crônica e as doenças metabólicas. Por isso, eles precisam de um olhar diferenciado do pediatra desde cedo”, reforça Keylla.
O acompanhamento regular com cardiopediatra e pediatra é considerado fundamental, especialmente nos primeiros anos. Nadja acrescenta que “quando há avaliação precoce e personalização do tratamento, é possível evitar complicações e oferecer a esses bebês a chance de uma vida normal, com crescimento adequado e sem limitações”.
