Empresas que fabricam no país disseram que decisão favorável à chinesa colocaria investimentos de R$ 180 bilhões em risco
Após um intenso movimento das principais montadoras de veículos que produzem no Brasil, o governo federal optou por uma solução intermediária em relação aos pleitos da BYD sobre o imposto de importação das peças que ela pretende importar para fazer a montagem dos veículos em Camaçari. Nesta quarta-feira (dia 30), a Câmara de Comércio Exterior, do Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio (Mdic) concedeu à montadora chinesa seis meses de incentivos, com cotas, de acordo com informações de bastidores. O pedido era de um período de três anos.
A ata com os detalhes da decisão deve ser divulgada em breve, mas a avaliação de participantes foi a de que o governo tentou encontrar uma “solução salomônica” para a questão que parecia caminhar para uma guerra aberta entre os dois lados interessados.
Os quatro principais grupos automotivos do Brasil divulgaram uma carta nesta quarta-feira (dia 30) ameaçando rever os planos de investimentos de R$ 180 bilhões no Brasil nos próximos anos, se o governo concedesse incentivos para que montadoras importem partes dos veículos e façam apenas a montagem aqui no país. Em resposta, a BYD chamou os autores da carta de “dinossauros” e insinuou que o grupo estaria desesperado por estar perdendo a concorrência com ela pelo mercado nacional.
Na última terça-feira (dia 29), a Anfavea, entidade que representa as montadoras em operação no Brasil, já vinha indicando que não aceitará passivamente que o governo estimule empresas operarem no regime de SKD, quando as partes dos automóveis já chegam prontas e são apenas juntadas no mercado final. “O Brasil não pode trocar a industrialização pela ilusão da montagem”, destacou Igor Calvet, presidente-executivo da Anfavea em sua conta no Linkedin, na última terça-feira.
Outra entidade do setor a se manifestar contra os incentivos para a BYD foi o Sindipeças, que enviou uma carta ao vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, que é também ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (Mdic), segundo informações do jornal Valor. “Mesmo com intenso e espantoso ingresso de veículos de passeio acabados, importados, com alíquotas de 12% e 18%, verifica-se que, não satisfeita, a BYD insiste com pleito de expressiva redução da alíquota do Imposto”, destaca a carta.
Na carta endereçada a Lula, os quatro grupos automotivos destacam a presença de 26 fabricantes de veículos no país e 508 produtores de autopeças, formando uma cadeia responsável por 2,5% do Produto Interno Bruto (PIB) do país. Ainda segundo o documento, a cadeia produtiva responde ainda por 20% do PIB industrial de transformação e a geração de 1,3 milhão de empregos, além de um faturamento anual de US$ 74,7 bilhões. “Nossa indústria planeja investir R$ 180 bilhões nos próximos anos, sendo R$ 130 bilhões no desenvolvimento e produção de veículos e outros R$ 50 bilhões no parque de autopeças”, projetam para a próxima década.
“É nosso dever alertar, Senhor Presidente, que esse ciclo virtuoso de fortalecimento da indústria nacional está sendo colocado em risco e sofrerá forte abalo se for aprovado o incentivo à importação de veículos desmontados para serem acabados no país”, ponderam as empresas.
Para elas, o regime de SKD será permanente, ao contrário do que tem prometido a BYD, de começar com SKD, evoluir para o CKD (quando as partes importadas são menores) até evoluir para um processo de fabricação da maior parte do veículo em território nacional.
Segundo as empresas, caso o incentivo seja concedido à BYD, a tendência é que toda a cadeia automotiva passe a adotar o mesmo modelo de produção, o que levaria ao colapso da indústria nacional. “Por uma questão de isonomia e busca de competitividade, essa prática deletéria pode disseminar-se em toda a indústria, afetando diretamente a demanda de autopeças e de mão de obra. Seria uma forte involução, que em nada contribuiria para o nível tecnológico de nossa indústria, para a inovação ou para a engenharia nacional” afirmam.